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RS e SC planejam duas safras de inverno para substituir uso de milho na ração animal
29/03/2021

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RS e SC planejam duas safras de inverno para substituir uso de milho na ração animal

Implantar o sistema de duas safras no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina para incentivar o aumento do cultivo de trigo, triticale, cevada, centeio, canola e aveia no inverno como alternativa ao milho na composição da ração para aves e suínos.

É com este objetivo que vem avançando o chamado Plano Duas Safras, que une o ex-presidente e atual conselheiro da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), Francisco Turra, chefes e técnicos de quatro unidades da Embrapa, o presidente do sistema Farsul, Gedeão Pereira, representantes das indústrias do setor, como JBS e BRF, e diretores de cooperativas da região sul.

A última reunião ocorreu na quinta-feira (25/3) de forma virtual, com a participação de cerca de 50 pessoas. Turra, intermediador do encontro, disse à Revista Globo Rural que, apesar de produzir 72% do milho nacional, RS e SC precisam importar até 5 milhões de toneladas por ano para alimentar suínos e aves, já que 80% da ração dessas cadeias é composta por milho e farelo de soja.

Como a safra de milho no sul vem de duas quebras consecutivas causadas pelo clima, há um aumento de demanda no mundo e o Brasil se tornou um grande exportador do produto, já não sobram grãos a preços competitivos para compor a ração de frangos e aves que fornecem a proteína animal mais barata.

Segundo ele, a logística impede que Santa Catarina, maior produtor de suínos do país, e o Rio Grande do Sul tragam o milho do Brasil Central, que também está usando mais grãos para produzir etanol.

Paraguai e Argentina, tradicionais fornecedores do insumo das agroindústrias de transformação de proteína animal, também não têm o volume necessário. A estratégia, então, formulada inicialmente com a Embrapa Trigo, é criar alternativas para substituir o milho.

“Nos dois Estados, são cultivados 8 milhões de hectares no verão e, no inverno, 5,5 milhões ficam ociosos. Antes, não havia muito incentivo porque as agroindústrias não se dispunham a comprar essas culturas, já que tinham excedente de milho. Hoje, busca-se alternativas porque não dá para repassar a alta do milho para o custo da carne de frango ou suína", diz Turra.

Inverno mais ativo
Gedeão, presidente da Federação da Agricultura do Rio Grande do Suul, diz que, devido ao inverno mais rigoroso que o restante do país, o Estado realiza apenas 1,09 safra por ano, quando poderia fazer duas como a maioria das regiões brasileiras.

O RS ocupa 6 a 7 milhões de hectares com soja no verão e apenas 1,1 milhão no inverno com trigo. “Rio Grande do Sul e Santa Catarina são grandes produtores de suínos e aves, mas essas atividades praticamente pararam por aqui devido à atual conjuntura do milho, que deixa o produto muito caro para nós.”

Osvaldo Vasconcelos, chefe-geral da Embrapa Trigo, diz que o inverno é a maior fronteira agrícola do Rio Grande do Sul. Segundo ele, a perda de competitividade da suinocultura e avicultura nos dois Estados do sul se agravou nos últimos anos e por isso a indústria vem reduzindo os abates.

Nesse cenário, sua unidade com sede em Passo Fundo (RS) se juntou inicialmente à Embrapa Suínos e Aves (Concórdia-SC) e depois à Embrapa Clima Temperado (Pelotas-RS) e Embrapa Pecuária Sul (Bagé-RS) para buscar tecnologias que possam tornar o cultivo dos grãos de inverno mais atrativos para produtores e indústrias.

Um trabalho de pesquisa já mostrou que é possível reduzir aproximadamente R$ 400 por hectare nos custos de produção do trigo com práticas de manejo eficiente e genética de qualidade. Vasconcelos e Gedeão afirmam que a indústria está muito interessada nas alternativas apresentadas.

“Sei que as indústrias já fecharam contrato com algumas cooperativas para entrega de cargas de triticale”, diz o chefe da Embrapa Trigo. “Falta estabelecer a qualidade dos grãos e sua capacidade energética na substituição do milho para termos uma precificação. Aí vamos levar esse pacote de tecnologias da Embrapa e de precificação para o produtor escolher se vale manter suas terras improdutivas no inverno ou se vai agregar mais a atividade agrícola”, diz Gedeão.

O dirigente da Farsul afirma que o plano Duas Safras também contempla a metade sul do Estado, focada em pecuária de corte e no plantio de arroz, onde houve um grande avanço da soja nos últimos anos.

Janela de oportunidade
Segundo Vasconcelos, o trigo, a mais plantada das culturas de inverno, terá aumento de 10% a 15% de área nesta safra no Rio Grande do Sul, de 5% a 8% no Paraná e deve manter volume em Santa Catarina (os três Estados produzem 87% do trigo nacional), mas está com alta demanda da indústria de panificação e acaba virando ração só quando perde qualidade.

Por isso, o triticale, uma mistura de trigo e centeio que tem custo de produção menor e maior produtividade que o trigo, seria o mais indicado para compor a ração. “Se a indústria quiser, o triticale substitui 100% o milho na ração de aves e 80% na alimentação de suínos", diz.

Nas contas de Vasconcelos, só para abastecer as unidades industriais da JBS e Alibem no Rio Grande do Sul com os cereais de culturas alternativas seria necessário plantar já mais 500 mil hectares.

Turra ressalta que a atual conjuntura do milho abre uma janela de oportunidade para os produtores. “Nós temos terra, máquinas ociosas, mão-de-obra, tecnologia da Embrapa, interesse da indústria e sementes para aumentar já em 500 mil o plantio das culturas de inverno", destaca.

Ex-ministro da Agricultura no governo Fernando Henrique Cardoso, Turra afirma que o projeto das duas safras já recebeu o apoio da atual titular da pasta, Tereza Cristina, mas ressalta que o plano é de médio prazo e não depende de incentivos governamental. “O objetivo é zerar nosso déficit de produto para a ração animal. Se conseguirmos isso em cinco anos, será um sucesso", projeta.

Fonte: Revista Globo Rural
Créditos da Imagem: United Soybean Board/CCommons