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Censo com 429 líderes do RS aponta soluções para a crise e maioria pede reforma tributária com redução de impostos
28/01/2021
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Estudo produzido para a Assembleia Legislativa traça diagnóstico detalhado das dificuldades e traduz expectativas e anseios.
A partir de entrevistas com 429 líderes regionais, ligados a entidades com ramificações em todo o território gaúcho, vem a lume o mais completo estudo sobre os desafios socioeconômicos do Estado em meio à guerra contra o coronavírus. Apresentado pela Assembleia Legislativa, o Censo Qualitativo 2020-21 — o Rio Grande após a pandemia oferece um diagnóstico detalhado da crise e aponta caminhos para a retomada, que passam por uma nova proposta de reforma tributária.
A pesquisa foi sugerida pela consultoria Confirma Brasil, especializada em análise política e projetos estratégicos, tendo como ponto de partida o Fórum de Combate ao Colapso Social e Econômico do RS. Promovido pelo Legislativo em 2020, o evento abriu o debate em busca de saídas para a derrocada.
— Ali, percebemos que tudo o que conhecíamos sobre a pandemia, até aquele momento, vinha de sondagens envolvendo cidadãos comuns. O setor produtivo, responsável pelo PIB do Estado, não tinha sido ouvido. Começamos, então, a estruturar um estudo com esse foco para a Assembleia — relata o jornalista Anilson Costa, sócio-diretor da Confirma Brasil.
Coube ao Instituto Pesquisas de Opinião (IPO) executar a missão. Entre dezembro de 2020 e janeiro deste ano, foram ouvidos presidentes, vice-presidentes, diretores regionais e prefeitos vinculados a federações empresariais, municipais, da indústria, da agricultura, do comércio, de entidades cooperativas e de apoio a micro e pequenas empresas.
Seis em cada 10 entrevistados apontaram perdas financeiras em suas áreas e projetaram, em média, 2,3 anos até a recuperação. A boa notícia é que a maioria estimou aumento de faturamento já em 2021, mas o desfecho dependerá, também, de ações governamentais. O censo revelou um anseio por mudanças.
— Ficou claro que não temos apenas um incêndio pós-pandemia para apagar. Temos um Estado para mudar. Essa é a grande conclusão da pesquisa. Precisamos de um novo modelo mental, de um novo propósito, de um desenho de futuro que leve em conta as dores de cada setor e não apenas o que os governos avaliam ser necessário para manter a máquina pública — destaca a cientista política e social Elis Radmann, diretora do IPO.
De forma recorrente ao longo do questionário, empresários, produtores rurais e comerciantes alertaram para o peso dos impostos, acentuado com a crise sanitária. A maior parte deles apontou urgência na revisão do sistema tributário, mas com uma lógica diferente, que não priorize o caixa do Estado.
Em 2020, o governador Eduardo Leite tentou aprovar amplo projeto de reforma, mas o resultado acabou sendo limitado. Agora, Leite planeja retomar o assunto. A julgar pelos dados da pesquisa, encontrará ambiente propício, desde que ouça o apelo do setor produtivo.
Para 54,8% dos líderes, reduzir tributos é determinante para desencadear um círculo virtuoso de desenvolvimento e tirar o Estado da letargia. A lógica é a seguinte: com menos impostos, eles sustentam que é possível baixar preços, ampliar vendas, elevar a demanda, abrir novas vagas de emprego e, consequentemente, alavancar a arrecadação do Estado e dos municípios.
As conclusões do estudo, na avaliação do presidente da Assembleia, Ernani Polo, servirão de subsídio tanto para deputados e prefeitos quanto para o governador, que já recebeu uma cópia do material. Entusiasta do tema da competitividade, Polo afirma que o trabalho permitirá a construção de saídas conjuntas.
— Temos em mãos uma radiografia profunda, qualificada e muito representativa sobre os impactos da crise e as alternativas pela frente. É, sem dúvida, uma grande contribuição ao debate — destaca Polo.
CENSO QUALITATIVO 2020-21 — O RIO GRANDE APÓS A PANDEMIA
A PESQUISA
Foi realizada pelo Instituto Pesquisas de Opinião (IPO) a pedido da Confirma Brasil para a Assembleia Legislativa. Tem patrocínio da própria Assembleia, além de Banrisul, BRDE, Famurs e Badesul.
OBJETIVOS
Compreender as condições do ambiente produtivo, competitivo e social da economia do RS no pós-pandemia, a partir das percepções de líderes políticos, sindicais e de entidades do setor produtivo.
COMO FOI FEITA
Envolveu 429 entrevistas com líderes regionais de nove entidades: Federasul, Fiergs, Farsul, Fecoagro, Famurs, Fecomércio, Ocergs, Sebrae e Fetag. Foram ouvidos presidentes, vice-presidentes, diretores regionais e prefeitos entre os dias 3 de dezembro de 2020 a 7 de janeiro de 2021.
Setores indicam melhoria na atividade econômica
Projetada por 53,1% dos entrevistados, a perspectiva de avanço no faturamento em 2021 é associada a três principais fatores: a crença na retomada da economia, a aposta na ampliação do consumo e a expectativa de condições climáticas favoráveis, decisiva para o agronegócio, considerado um dos fios condutores da superação da crise no Rio Grande do Sul.
Os motivos para acreditar na recuperação variam de acordo com o segmento, mas os líderes regionais compartilham a percepção de que há demanda reprimida no Estado, que terá vazão no decorrer de 2021.
— Ao mesmo tempo em que amargam dores e perdas, os líderes têm esperança, têm enorme vontade de trabalhar, de conquistar bons resultados. As entrevistas que fizemos indicam esse desejo de fazer a roda girar pelo bem comum. Uma ideia muito presente nas narrativas é a de que o Rio Grande do Sul se desenvolve para além de governos, pelo trabalho dos gaúchos. Da porta para dentro, as coisas acontecem. O problema são as dificuldades dos empresários da porta para fora — afirma Elis Radmann, diretora do IPO.
A pesquisa mostrou que os responsáveis pelo PIB gaúcho clamam por medidas governamentais capazes de acelerar o processo de regeneração da economia. Entre as ações citadas, estão estímulos ao empreendedorismo, com a redução da burocracia e da interferência estatal, e a necessidade de manutenção das isenções fiscais, tema delicado e controverso.
O fomento à competitividade é outro fator mencionado por muitos. Para os entrevistados, isso significa revisar impostos, desonerando setores e direcionando os valores arrecadados para investimentos em infraestrutura e logística.
— Tendo redução (da carga tributária), a gente tem competitividade. Estamos logisticamente no sul do país. Automaticamente, isso tem um custo maior do que o custo de quem está no Centro, e a gente compra matéria-prima do Centro do país, produz aqui, um dos lugares onde o salário mínimo regional é o mais alto, e depois redistribui para o Brasil. Isso tem um custo muito grande que atrapalha a competitividade da indústria gaúcha — relatou um dos líderes industriais ouvidos no censo.
Radiografia por setor:
Agronegócio
A principal queixa do segmento está relacionada à instabilidade climática. O setor ainda se recupera da estiagem de 2019/2020 e se sente vulnerável às intempéries. As medidas de auxílio governamental são consideradas limitadas e burocráticas. O setor sente falta de acesso mais fácil ao crédito.
Expectativa: além da expectativa de um clima mais favorável, o setor alimenta projeções positivas com base na alta do preço dos produtos, devido ao aumento da demanda interna e externa. Aposta ainda na força do cooperativismo como propulsor da atividade.
Indústria
Foi impactada pela elevação no custo de produção e reclama da falta de incentivos governamentais. O setor se ressente da alta dos preços e da escassez de insumos e de matéria-prima, o que ampliou a sensação de baixa competitividade frente aos demais Estados. O peso da carga tributária do RS também é alvo de críticas e contribui para uma visão negativa da competitividade.
Expectativa: para o líderes regionais, o crescimento depende de um ambiente com menos impostos e com taxas mais justas. Eles também sustentam uma perspectiva de retomada baseada na busca de soluções criativas e no aumento das exportações. Consideram a tecnologia a principal aliada para o desenvolvimento e expansão da produção.
Comércio
A maior dificuldade, segundo os entrevistados, é a carga tributária. A taxação é vista como o grande entrave ao setor, cuja projeção de crescimento é associada à desoneração das empresas, somada a incentivos. Há preocupação sobre a redução do poder de consumo, amenizada pelo auxílio emergencial, mas agravada pelas medidas restritivas devido à pandemia.
Expectativa: a projeção é de ampliação das vendas. Líderes avaliam que a demanda reprimida pelos efeitos da covid-19 deverá ter vazão em 2021. Também propõem que as micro e pequenas empresas sejam fortalecidas com políticas de desburocratização e de apoio ao desenvolvimento.
Cooperativas
A análise dos entrevistados é de que faltam estímulos aos empreendedores. A carência de incentivos, seja pela desoneração ou pela oferta de financiamentos, obstrui a expansão do setor e impede a ampliação da oferta de emprego e renda. Os líderes ouvidos também apontam a falta de linhas de crédito, principalmente para micro e pequenas empresas.
Expectativa: a saída, na visão do setor, parte do incentivo às cadeias produtivas e à cooperação. As cooperativas ligadas ao agronegócio não sentiram os impactos da covid-19 e contam ainda com a valorização dos produtos e a expansão da exportação de commodities. Reforçam a importância de promover o consumo local para fomentar a economia e valorizar a produção.
Gestão pública
Os desdobramentos da pandemia são o grande desafio. Administrar a crise sanitária exigiu resiliência e improviso, em uma realidade que já era de escassez. O receio da redução dos repasses federais em 2021 traz incertezas. Os gestores veem nos valores do ICMS um limitador.
Expectativa: a esperança está depositada na vacinação. Além disso, é considerada fundamental a disponibilidade de mais crédito do Estado e da União para a população por meio de programas de renda. Os gestores avaliam como urgente a revisão do pacto federativo para obter mais verbas.
Fonte: Zero Hora
Créditos de Imagem: Ronaldo Bernardi/ Agência RBS