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Foco na biosseguridade
18/12/2017

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Foco na biosseguridade

Em ano tumultuado para o segmento, a condição sanitária da avicultura brasileira foi considerada fundamental para que os prejuízos decorrentes da Operação Carne Fraca não fossem ainda maiores. Enquanto alguns dos seus principais concorrentes enfrentaram surtos de Influenza Aviária, o Brasil – maior exportador de carne de frango do mundo – segue livre da doença, mas mantém o desafio de investir em sanidade para garantir o status diferenciado. Iniciativas para reforçar o controle estão em andamento tanto na esfera pública quanto na privada.

Houve focos da Influenza Aviária nos Estados Unidos e na China, mas os casos que mais preocuparam o Brasil, pela proximidade, foram os do Chile. Naquele país foi notificada a ocorrência do subtipo H7N6, de baixa patogenicidade, no final de 2016 e no início de 2017, em duas granjas de perus de corte na região de Valparaíso. A situação levou ao sacrifício sanitário de cerca de 385 mil perus. “Aquilo acendeu a luz amarela, quase vermelha”, lembra o presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), Francisco Turra. Além de redobrar cuidados no transporte aéreo entre os dois países, o governo federal adotou medidas como a publicação da Instrução Normativa 8, dando prazo até 3 de março de 2018 para todas as granjas obterem registro no serviço oficial.

Altamente contagiosa, a Influenza Aviária pode provocar danos tanto pelo seu potencial zoonótico (transmissível ao ser humano), quanto pelo seu impacto econômico, com mortalidade ou sacrifício de aves e restrições comerciais. Para o diretor-executivo da Associação Gaúcha da Avicultura (Asgav), José Eduardo dos Santos, o surto mundial de Influenza foi “o outro lado da moeda”, numa referência às perdas após a Operação Carne Fraca. “Isso acabou fazendo com que os países continuassem a depender da carne de frango do Brasil”, explica.

A recente abertura do mercado filipino, com 100 milhões de habitantes, foi comemorada por dirigentes do setor. A China, maior comprador da carne brasileira, autorizou em novembro a habilitação de mais 22 plantas, sendo 11 de carne bovina e 11 de aves. Além disso, as vendas do Brasil para outros países da Ásia e do Oriente Médio seguem aquecidas. No caso do Chile, que mantém embargo à carne de frango do Rio Grande do Sul e de outros estados, uma missão daquele país é aguardada para janeiro. A expectativa é que autorize a retomada das compras.

O Rio Grande do Sul contou com um “escudo natural” como grande aliado na busca pela biosseguridade, já que seus parques de aves migratórias – que podem transmitir o vírus – estão distantes das zonas de produção avícola e agroindustrial. Nas granjas, a visitação de pessoas que não estejam envolvidas na produção é desaconselhada. Durante a Copa do Mundo de 2014 e a Olimpíada de 2016 os cuidados foram redobrados para evitar o ingresso da enfermidade.

O conjunto de medidas, porém, não é sinônimo de invulnerabilidade. O diretor da Asgav cobra que a atenção dada ao setor corresponda ao seu impacto na balança comercial, tendo em vista que o Rio Grande do Sul é o terceiro maior exportador de frango do Brasil. A fragilidade econômica dos governos estadual e federal preocupa porque pode comprometer os investimentos, especialmente na área de fiscalização. “Temos que manter o alerta total. Há acordos bilaterais que permitem tanto a exportação quanto a importação de outros tipos de alimentos que vêm de países que já tiveram ocorrência de Influenza”, justifica Santos.

Embora a Influenza Aviária continue sendo uma doença exótica (nunca detectada) no Brasil, a vigilância segue. O Ministério da Agricultura conta com um plano de contingência tanto dela quanto da Doença de Newcastle (DNC). “Se a enfermidade ingressar no país, os esforços devem seguir até a erradicação, por meio do sacrifício sanitário da totalidade das aves do estabelecimento avícola, métodos de de população, desinfecção e limpeza das instalações e vigilância epidemiológica no entorno, com pessoal devidamente capacitado na zona de foco”, observa a veterinária Tais Oltramari Barnasque, responsável pelo Programa Nacional de Sanidade Avícola na Superintendência do Ministério da Agricultura no Rio Grande do Sul e coordenadora do Comitê de Sanidade Avícola do Estado.

ALTAMENTE CONTAGIOSA

A Influenza Aviária é uma doença exótica no Brasil. Sua importância se relaciona com o potencial zoonótico e impacto econômico que ocasiona, seja por perdas produtivas na cadeia avícola, mortalidade de aves, medidas de sacrifício para sua contenção ou restrições comerciais. A enfermidade é altamente contagiosa e tem como principais hóspedes aves domésticas, como galinhas e perus, bem como aves silvestres. As aves aquáticas e as costeiras parecem ser os reservatórios naturais dos vírus de Influenza Aviária tipo A e são portadoras de todos os subtipos conhecidos. Fonte: Tais Oltramari Barnasque, Mapa/RS.

Frentes de vigilância

O registro de estabelecimentos avícolas no serviço veterinário do Rio Grande do Sul, em andamento, é uma das medidas adotadas como resposta ao surto recente de Influenza Aviária em alguns países estrangeiros. A medida está prevista na Instrução Normativa nº 8, do Ministério da Agricultura, e estabelece prazo até 3 de março de 2018 para o cadastramento das granjas. O texto prevê ainda a exigência de colocação de telas em galpões de aves poedeiras, e não apenas nas de corte, como já era previsto. “O setor tem se empenhado ao máximo porque sabe da importância de mantermos o país livre de enfermidades”, afirma o diretor-executivo da Asgav, José Eduardo dos Santos.

No Rio Grande do Sul, dois sítios de aves migratórias – o Parque Nacional da Lagoa do Peixe e o Taim – receberam, em fevereiro e em setembro de 2017, equipes de veterinários oficiais para ações de vigilância epidemiológica em propriedades de subsistência localizadas num raio de 10 quilômetros. No entorno da Lagoa do Peixe foram avaliadas 448 propriedades, com amostra de 518 aves. No Taim, foram 567 propriedades, com 710 amostras. “Aves aquáticas, silvestres e migratórias são as principais disseminadoras já que, ao migrarem, podem excretar grande quantidade de vírus e contaminar os novos ambientes”, explica a veterinária Tais Oltramari Barnasque, do Mapa/RS.

Os dois parques contam com situações distintas no que se refere à população de aves. A região da Lagoa do Peixe, que abrange os municípios de Mostardas, Tavares e São José do Norte, é frequentada principalmente por aves de pequeno porte oriundas da América do Norte, em especial do Canadá, que chegam fugindo do inverno no Hemisfério Norte, em meados de setembro, e retornam ao local de origem a partir de outubro. Na caso do Taim, a população de aves migratórias é composta principalmente por patos e marrecos vindos da Patagônia. Segundo o veterinário Flávio Chassot Loureiro, do Programa Estadual de Sanidade Avícola, o produtor deve comunicar qualquer ocorrência de mortandade ao responsável técnico pela granja, para que as causas sejam examinadas. No caso das aves livres, em sistemas de produção caipira, por exemplo, Loureiro afirma que o risco é maior. No entanto, as próprias instruções normativas em vigor estabelecem parâmetros que visam garantir a biosseguridade. A alimentação dos animais, por exemplo, deve ocorrer sempre no galpão e nunca no piquete, que não deve contar com a presença de árvores frutíferas, o que poderia atrair aves ao local.


IMPORTADORES DEMONSTRARAM CONFIANÇA NO BRASIL

A confiança dos países importadores da carne de aves brasileiras ficou demonstrada após a Operação Carne Fraca, ocasião em que 74 países suspenderam os embarques temporariamente. Hoje, apenas três mercados pequenos – Santa Lúcia, Trinidad & Tobago e Zimbábue – permanecem fechados à entrada do produto. Na avaliação de Francisco Turra, presidente da ABPA, a condição sanitária foi um fator determinante para que os prejuízos decorrentes da operação deflagrada pela Polícia Federal em março não fossem maiores. “Muitos mercados que poderiam até ter se mantido afastados terminaram não tendo essa opção porque realmente o Brasil é diferenciado”, observa.
No caso da África, por exemplo, a importação de carne brasileira aumentou 50% neste ano. O continente registrou, em 2017, diversos focos do vírus em diferentes países. Hoje o Brasil conta com 160 mercados abertos à carne de frango, dos quais 140 realizam negócios de forma efetiva. Para 2018, a expectativa da ABPA é de que as exportações cresçam até 3% em volume, desempenho que poderá ser influenciado pela habilitação de novas plantas pela China, pela recuperação dos níveis de embarques para a União Europeia e Oriente Médio, e pela abertura de mercados como Taiwan, El Salvador e República Dominicana.

Aplicativos aliados
A biosseguridade no setor avícola ganhou um importante aliado, nos últimos dias, com a criação de um aplicativo denominado GeoAves, fruto de um convênio do Fundo de Desenvolvimento e Defesa Sanitária Animal (Fundesa) com a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).

O aplicativo desenvolvido pela universidade, disponível para a plataforma Android, conta com um cadastro das granjas produtoras, que será constantemente atualizado por técnicos das empresas integradoras. Para cada estabelecimento, haverá 150 perguntas a serem preenchidas periodicamente. Entre as informações a serem preenchidas estão questões como a densidade avícola, acessos à propriedade, proximidade com outros estabelecimentos, sistemas de produção, capacidade instalada, barreiras naturais, alimentação dos animais e destino de aves mortas.

As informações serão armazenadas em um banco de dados, a cargo da UFSM. Com base nesses dados, Ministério da Agricultura, Seapi e Fundesa poderão monitorar em tempo real o nível de biosseguridade da avicultura gaúcha. O professor Luiz Fernando Sangoi, que comanda a Coordenadoria de Educação Básica, Técnica e Tecnológica (CEBTT) da UFSM, explica que, de outra forma, as empresas do setor teriam de investir pesado em equipamentos para coleta de dados. O telefone celular, segundo ele, facilita a operação, já que não será necessário contar com internet na propriedade rural para que os técnicos façam a atualização das informações. “A função do aplicativo simplesmente é coletar as informações no campo”, resume. Iniciativa semelhante está em andamento junto ao setor da suinocultura, por meio do aplicativo GeoSuínos, que conta com pelo menos dez empresas participantes.

Fonte: Correio do Povo – Por Danton Júnior
Créditos da Imagem: Correio do Povo